Entrevista

Girolando: Ter números confiáveis do desempenho dos rebanhos e da fazenda ainda é um gargalo na pecuária leiteira. Como o produtor pode melhorar essa gestão dos dados e como isso pode impactar positivamente o negócio?

Heloise Duarte (HD): Com a ajuda de ferramentas adequadas, como um sistema de gestão por exemplo, o produtor pode identificar pontos que necessitem de atenção e atuar no sentido de aprimorar a eficiência produtiva, reprodutiva, sanitária e, por conseguinte, econômica na atividade leiteira. Para comprovar o impacto positivo da implantação de um sistema de gestão, avaliamos a evolução do desempenho zootécnico, após a introdução de controles informatizados em fazendas, ao longo de três anos. Nesse estudo específico, foram avaliadas propriedades com rebanho de até 200 vacas, que implantaram o Sistema de Gestão IDEAGRI no ano de 2016. Para a comparação da evolução do desempenho, foi calculado, para tais fazendas, a nota única Índice Ideagri do Leite Brasileiro (IILB), que considera 12 indicadores de 2017 para 2019. Os resultados mostraram que houve houve melhoria no desempenho zootécnico em 68,9% das fazendas, após a implantação do sistema de gestão.

Girolando: O tamanho da fazenda tem relação direta com seu desempenho geral e com sua eficiência ou é possível ganhar dinheiro com leite mesmo sendo um pequeno produtor?

HD: Pequenas fazendas que adotam a gestão moderna com base em números alcançam índices de produtividade muito relevantes. No último boletim do IILB, vimos que as fazendas de até 100 vacas obtiveram índice igual aos das propriedades com mais de 300 animais. A escala da produção pode ser vantajosa, especialmente no Brasil, onde enfrentamos grandes desafios logísticos, mas com a gestão da fazenda é possível conquistar eficiência produtiva, reprodutiva, sanitária e econômica na atividade leiteira, independentemente do tamanho do rebanho. Seja grande, médio ou pequeno, desde que haja competência na gestão da fazenda, é possível que a produção seja eficiente e, por conseguinte, se obtenha melhor rentabilidade.

Girolando: Quais os índices zootécnicos impactam mais o desempenho de uma propriedade?

HD: Ao definirmos a formação do IILB, que é um indicador unificado em uma nota de 0 a 10, selecionamos 12 indicadores que consideramos básicos e gerais para o rebanho. Esses indicadores “contam” a história da fêmea desde seu nascimento, passando por sua vida produtiva e reprodutiva, até a sua saída da fazenda: (1) Taxas de sobrevivência fêmeas – 12 meses (%); (2) Idade das novilhas ao primeiro serviço (meses); (3) Taxa de concepção novilhas (IA/TE/FIV) (%); (4) Idade ao primeiro parto das matrizes (meses); (5) Taxa de prenhez em vacas (%)/ (6) Produção de leite – 305 dias (primíparas); (7) Produção de leite – 305 dias (secundíparas); (8) Produção de leite – 305 dias (multíparas); (9) Taxa de mortalidade de vacas; (10) Produção média mensal vaca (kg); (11) Dias em lactação (DEL) médio e (12) % de vacas em lactação em relação ao total de vacas.

Girolando: Existe algum dado dentro do Índice Ideagri ligado ao impacto da qualidade da genética bovina na rentabilidade do negócio?

HD: Quase todos, na verdade. Aqueles relacionados à produtividade de leite são mais facilmente ligados à carga genética dos animais. Todavia, sabemos que tanto o desempenho reprodutivo quanto a conformação e saúde dos animais (que impactam em sua longevidade na fazenda) são características que podem ser aprimoradas pelo melhoramento genético.

Girolando: Fala-se muito hoje da pecuária 4.0, mas o Brasil é um país de várias realidades quando o assunto é acesso à tecnologia. Para os pequenos produtores qual é o caminho?

HD: Toda a indústria da pecuária está caminhando para o modelo 4.0 da automação total, e quem quer seguir esse caminho vai precisar de um sistema de gestão informatizado e integrado. A modernização da gestão operacional e estratégica nas fazendas ainda não é padrão universal, mas está avançando e o pequeno produtor precisa estar preparado para avançar junto com tudo isso. E o quanto antes ele começar a se movimentar nesse sentido, melhor.

Girolando: A pandemia do coronavírus evidenciou a urgência de um planejamento a médio e longo prazo para as propriedades rurais leiteiras. Quais lições tirar desse fato e como o setor pode superar os estragos dessa crise?

HD: Os pequenos produtores já encontram certa dificuldade no dia a dia de seus negócios e experimentarão um aumento da incerteza nos próximos meses em função dos impactos do novo coronavírus. A situação atual evidencia que existem inúmeros fatores sobre os quais o produtor não tem controle, que estão fora da fazenda, fora da operação principal. Por isso, fazer bem o que está ao seu alcance parece ser, sem dúvidas, algo a se considerar seriamente. Fazer o “dever de casa” e aprimorar a gestão dentro da porteira, independentemente do tamanho da fazenda, dará mais chances para que ela continue existindo.

Girolando: O Ideagri lançou recentemente a campanha “Proteger o leite é proteger a vida”. Como funciona e de que forma vai ajudar o produtor a melhorar seu negócio?

HD: Por meio da campanha, já estamos distribuindo, sem custos, mil licenças do software de gestão agropecuária básico Techmilk, desenvolvido para o uso de pequenos produtores de leite com fazendas de até 200 animais no rebanho. A gratuidade de uso do sistema vai até o dia 31 de dezembro de 2020. Para ter acesso ao software, os produtores interessados devem fazer um pré-cadastro no site www.techmilk.com.br. Ao disponibilizar um sistema de gestão a essas fazendas, estamos ajudando a proteger parte importante da cadeia alimentar do Brasil, que é um fator de segurança e de bem-estar da população, porque proteger o leite é proteger a vida. O Techmilk possui um conjunto básico de rotinas de reprodução, produção, sanidade e recria, com 12 relatórios de gestão que ajudam o produtor rural a controlar sua fazenda. Com esses dados é possível administrar a propriedade e o rebanho de forma controlada e realista. A partir da primeira atualização, prevista para agosto, será disponibilizado também um módulo financeiro: um controle de receitas e despesas para o produtor entender se está ganhando ou perdendo dinheiro. A opção da gratuidade ajudará os produtores em um momento de dificuldade e a adoção de um software de gestão significará uma evolução para muitas propriedades. Com o Techmilk, o usuário também terá acesso ao boletim do Índice Ideagri do Leite Brasileiro (IILB), que traz análises comparativas de produção de leite por região e tipo de rebanho.

Girolando: Qual é o foco da atuação do Ideagri no país?

HD: Somos um empreendimento no ramo de tecnologia da informação e temos como foco principal a prestação de serviços voltados para o agronegócio, através de sistemas informatizados para a gestão do negócio rural. Nossa sede é em Belo Horizonte, Minas Gerais, e possuímos, em carteira, quase 5.000 fazendas de gado de leite e de corte do Brasil. No setor do leite, somos líder no mercado, com mais de 50% dos top 100 produtores desse segmento no país. Nossa empresa é responsável pelo Índice Ideagri do Leite Brasileiro (IILB), uma referência na medição da produtividade do setor leiteiro nacional. Fundada há 12 anos, a Ideagri tem um terço de seus funcionários alocados na área de desenvolvimento e inovação.

Girolando: A Girolando e o Ideagri vêm trabalhando em parceria em alguns projetos. Para 2020, qual é a novidade prevista?

HD: Nós temos um alinhamento excelente como toda a Equipe da Girolando. Tanto em relação às questões de tecnologia da informação, quanto em relação aos acompanhamentos dos dados genealógicos e zootécnicos dos animais. Uma busca comum entre a Girolando e a Ideagri torna nossos projetos em conjunto muito mais eficientes – buscamos agregar valor aos associados ou clientes, de forma mais simples e efetiva possível. O pioneirismo em integrar o sistema da Girolando com o sistema da Ideagri, surgiu desta premissa, facilitar a vida do usuário que, com o mesmo lançamento de dados pode fazer seus controles operacionais e gerencias e, também, as comunicações com a Associação de Raça. Estamos, com muito orgulho, ao lado da Associação e dos criadores, para participar da construção da Girolando 4.0, com projetos extremamente relevantes. Alguns em fase mais avançada (padronização da base de pais entre os sistemas, convênio de cooperação mútua Embrapa + Girolando + Ideagri) e outros em etapas iniciais ou intermediárias (mecanismos para coleta de leite a campo, gestão de rebanho colaboradores etc.), só para citar alguns itens. Mas podem estar certos de que vem muita, muita coisa boa por aí!