Exercer trabalho em equipe não é carregar todo mundo nas costas, mas confiar no talento dos seus pares. Veja o ponto de vista, publicado na Revista Brasileira de Administração, do Administrador Leandro Vieira, criador do administradores.com e autor do livro "Seu Futuro em Administração".

Inevitavelmente, independente do porte da organização, você irá trabalhar com outras pessoas. Fato. Saber lidar com os demais, aceitar suas particularidades, controlar o seu próprio gênio, independente de exercer o papel de líder em um grupo, são questões fundamentais para o seu sucesso como administrador.

Particularmente, aprendi isso no tapa. Em minha adolescência, fiz parte do grêmio estudantil do colégio. Sabe aquele sujeito que pega todo o trabalho para si para depois ficar reclamando que ninguém faz nada e só ele é responsável por tudo? Eu era esse cara. Certa vez, em um bate-boca na sala de reuniões, um dos membros do grupo se virou para mim e disse: “Leandro, você é muito bom no que faz sozinho, mas não sabe nem um pouco trabalhar em equipe”. Essa foi a melhor bofetada que já levei na vida, vinda de um garoto de 15 anos. A partir desse dia, passei a mudar minhas atitudes e minha própria percepção sobre trabalhar com outras pessoas, e isso foi algo decisivo na vida profissional que vim a desenvolver muitos anos depois. Espero poder encontrar novamente aquele garoto para lhe agradecer pelo que fez por mim.

NÃO TENTE ENTORTAR A COLHER

Logicamente, essa mudança não foi instantânea, do tipo água para o Tang. Você reconhecer que tem uma fraqueza é apenas o primeiro passo, mas superá-la envolve uma verdadeira batalha consigo mesmo e com seu ego maldito, que teima em iludi-lo com falsas percepções sobre você mesmo e sobre os outros. E quando se consegue superar isso de fato?

Não sei se você assistiu ao filme “Matrix”, um dos meus preferidos de todos os tempos. Em uma determinada cena, Neo, o personagem que vive uma jornada ao encontro de si mesmo, vê um garotinho entortando uma colher, aparentemente apenas com a força do pensamento. O diálogo que se segue é memorável. Enquanto Neo olha desconcertado para a colher, o garotinho fala:

- Não tente entortar a colher. É impossível. Em vez disso, tente apenas ver a verdade.

- Que verdade? – pergunta Neo.

- Não existe colher – responde o pequeno monge.

- Não existe colher? - estranha Neo.

- Você verá que não é a colher que entorta. É você mesmo. – conclui o garotinho.

Qual é o ponto aqui?

Em sua jornada pessoal de crescimento, você irá procurar as raízes de suas crenças, de suas idiotices, de seus medos e inseguranças. Você irá procurar seu ego, porque você quer dominá-lo e não ser dominado por ele. O que ocorre é que nessa busca pelo ego, você irá descobrir a verdade. Que verdade? Não existe colher. Não existe ego. Essas distorções do tipo “eu sou o cara” não passam de desejos, necessidades de autoafirmação, aceitação, reconhecimento, ou qualquer outro tipo de armadilha do ego – o tal ego que nem existe.

Quando você se dá conta disso, acaba se abrindo para o verdadeiro crescimento. Você reconhece que pouco sabe, e isso abre a sua mente para que muito aprenda. Você se dá conta de que o mundo é um lugar de possibilidades fantásticas, e que as pessoas que encontra pelo caminho têm muito a lhe ensinar.

Espero não ter dado um nó na sua cabeça com essa piração, mas, voltando ao nosso assunto, anote o que vou dizer agora: nós só conseguimos as coisas – qualquer coisa – através das pessoas. Não quero soar utilitarista quando digo isso, muito pelo contrário. O que quero deixar evidente para você, caro leitor, é que todas as nossas conquistas não são conquistas individuais. Haverá sempre a contribuição de incontáveis pessoas. Observe sua própria história de vida e tente reconhecer essas pessoas. O professor que lhe encorajou a aprender algo, alguém que lhe deu uma oportunidade de estágio ou trabalho, o sujeito que criticou alguma atitude errada sua, ou o outro que elogiou o seu trabalho. Seus pais. A sua companheira ou companheiro. Reconheça, seja sempre grato e nunca se esqueça: não existe colher.

Fonte: Revista Brasileira de Administração, Edição Nov/Dez de 2015