Em entrevista para a revista Pecuária Brasil, o presidente da Abraleite, Geraldo Borges, fala sobre as fronteiras do leite brasileiro e os desafios do setor. Ele opina sobre a imagem do produto diante do consumidor e conta sobre o trabalho da entidade para promover toda a cadeia produtiva do leite. O presidente da Abraleite ainda comenta sobre os casos de celebridades que divulgam informações equivocadas ou distorcidas sobre o setor e alerta para a necessidade de informar corretamente a população.
As fronteiras do Leite Brasileiro: O que falta para nossa pecuária leiteira ganhar o mundo?
Presidente da Associação Brasileira dos Produtores de leite (Abraleite), Geraldo de Carvalho Borges tem 49 anos de idade, e desde infância está envolvido com a pecuária leiteira. Ele é filho, neto e bisneto de produtores rurais, e leva a tradição da família adiante, criando as raças Gir Leiteiro em Girolando no interior de Minas Gerais e do Pará. Possui pós-graduação em Gestão Empresarial Estratégica e já foi por duas vezes presidente do Sindicato dos Criadores, sediada em Brasília (DF), do qual foi um dos fundadores e hoje é vice-presidente. É também um dos fundadores e foi conselheiro da Federação da Agricultura e Pecuária do Distrito Federal (Fape -DF), conselheiro da Associação Brasileira dos Criadores de Girolando, presidente da Câmara Setorial do Leite do DF e membro da Câmara Setorial do Leite do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Geraldo também foi membro do Conselho Diretivo da Associação Brasileira dos Criadores de Gir leiteiro (ABCGil) e representante da Fape-DF na Comissão da Pecuária de Leite na Confederação Nacional da Agropecuária (CNA), na qual atualmente é membro, representando Abraleite. Também já ocupou diversos outros cargos em várias entidades do setor produtivo nacional, inclusive participando da criação de algumas.
Pecuária Brasil. No cenário internacional, o Brasil já disputa lado a lado mercados como o da carne e o da soja. Porém, o leite o brasileiro ainda não tem essa competitividade. Por quê? No que o Brasil precisa investir para ganhar competitividade do mercado externo?
Geraldo Borges. O leite produzido no Brasil ainda não é competitivo pelo fato de ser uma cadeia produtiva que precisa ser organizada, na qual precisaremos aumentar a qualidade e os índices de produtividade, resolver os problemas de ordem sanitária, sobretudo em relação à brucelose e à tuberculose, e principalmente ter uma desoneração em todos os elos da cadeia, aos produtores, às indústrias de laticínios e cooperativas, que sofrem assimetrias com outros países produtores e exportadores de lácteos. Temos muita tributação, encargos e despesas trabalhistas de uma CLT, que produtores de leite de outros países como os Estados Unidos e a Nova Zelândia não tem, obrigações ambientais com o ônus todo por conta do produtor brasileiro e problemas estruturais como energia elétrica rural de péssima frequência, estradas vicinais muito mal conservadas em um país de dimensão continental de logística difícil e cara, falta de assistência técnica, dentre outros.
PB. Com relação ao trabalho dentro da porteira, o produtor brasileiro, no geral, já está preparado e tem que tecnologia suficiente para ter competitividade frente aos concorrentes internacionais?
GB. Existem produtores de leite no Brasil extremamente eficientes, com gestão eficiente, tecnificados, com altos índices de produtividade por matriz e por hectare em todos os sistemas de produção, produzindo com qualidade e gerindo seu negócio com bons e até ótimos resultados. Mas, a grande maioria não está preparada, não tem bons índices, não estão tecnificados e nem chega eles assistência técnica. Segundo o Censo Agropecuário do IBGE 2017/18, divulgado recentemente, são aproximadamente um milhão e duzentas mil propriedades produtores de leite, em 99% dos municípios brasileiros, com extrema variabilidade dos mais diversos estilos de produção e extrativismo, muito pulverizada em todo país e com baixa média de produção.
PB. Pensando no mercado interno, como fortalecer o cenário do leite?
GB. Viajo o Brasil dando palestras, reunindo e conversando com produtores, técnicos e profissionais do setor em geral. Sempre faço a mesma pergunta para eles: quantas pessoas você convenceu a beber leite e consumir derivados lácteos hoje? Ou ainda: quantas pessoas você convenceu hoje de que o leite e seus derivados são bons para Saúde? Todos nós conhecemos alguém que não bebe leite por algum motivo, alguém que está pensando em reduzir o consumo, ou alguém que poderia se beneficiar dele. O consumo está estagnado há cinco anos no país. É claro que é um problema influenciado também pelo cenário econômico, porém, falta incentivo ao consumo de leite. Nós temos um problema de imagem. Falta trabalho de marketing em cima do nosso produto. As pessoas que são contra a produção e o consumo de leite, como os veganos, estão fazendo um trabalho bem melhor, apesar de serem muito menos numerosos. Qualquer notícia negativa sobre o setor, por mais isolada e esporádica que seja, causa enorme repercussão nas redes sociais e na mídia em geral, e nós ainda não estamos combatendo isso de maneira eficiente. É necessário levar informação para as pessoas. Hoje, o consumidor quer saber a origem do produto que vai comprar, quer saber sobre bem-estar animal, preservação ambiental, responsabilidade social. E essa é uma tendência mundial. Então, se queremos crescer no mercado nacional e internacional, precisamos mais do que atender a todos esses quesitos, precisamos comunicar que eles estão sendo muito bem atendidos, e que nosso produto é bom.
PB. Quais são as ações práticas que Abraleite está promovendo nesse sentido?
GB. Em seus dois anos de existência, Abraleite vem divulgando matérias que mostram as virtudes do leite e dos derivados lácteos como alimento saudável o ser humano em todas as fases da vida, bem como mostrando a importância econômica e social que a cadeia produtiva do leite tem para toda sociedade, evitando desemprego no campo, o êxodo rural e o consequente inchaço e aumento de índices de criminalidade nas grandes cidades. Também nesse sentido de informação à sociedade, a Abraleite tem promovido e apoiado ações, entrevistas e participações em programas de TV, rádio, mídia escrita e digital. Está sendo desenvolvido um segundo vídeo institucional da entidade, para ser amplamente divulgado, onde é realçada para a sociedade a importância do leite dos produtos lácteos na nutrição humana na economia do país. Outro projeto andamento é a viabilização de consumo de leite em repartições públicas e, ainda, a compra governamental para instituições de educação, assistência social, centros de detenção, entre outras.
PB. As pessoas públicas e celebridades nem sempre colaboram para que a imagem do leite seja mais verdadeira para o consumidor, como é o caso da cantora Anitta, que recentemente divulgou informações truncadas sua produção leiteira. Outros casos mais sérios divulgaram informações completamente equivocadas. Como o setor pode rebater esse tipo de “ataque” de maneira que fique para o consumidor uma imagem mais positiva do leite?
GB. Infelizmente, há pessoas desinformadas e outras mal intencionadas falando inverdades que chegam à sociedade e podem causar um estrago enorme, fazendo com que pessoas deixam de consumir produtos. Isso não ocorre somente com leite e lácteos. A carne sofre esses mesmos “ataque”, o ovo já sofreu, assim como tantos outros alimentos de cadeias produtivas importantes do nosso Agronegócio. Por isso, estamos cada vez mais focados em divulgar a verdade sobre o leite e seus subprodutos, incentivando também que as pessoas só divulguem notícias verdadeiras sobre nossa atividade. Estamos falando, cada vez mais, sobre a cadeia produtiva, que gera mais de cinco milhões de empregos diretos e muito mais empregos indiretos, sobre o como produtor de leite importante para nossa nação e para o mundo, sobre como ele preserva o meio ambiente, emprega pessoas no campo com vida digna e como pratica bons tratos aos animais. Até porque a preservação do meio ambiente, dos mananciais hídricos e o bem-estar das pessoas que trabalham na pecuária leiteira e dos animais são vitais para nossa atividade, e as pessoas precisam saber disso.
PB. Se o senhor pudesse dar um conselho para cada produtor de leite do Brasil, que falaria para eles?
GB. Que seja persistente, que seja cada vez mais eficiente em sua gestão do seu negócio, que se profissionalize cada vez mais, se aperfeiçoe com o tecnificação e busque informações, assistência técnica, melhoramento genético e outras práticas que o ajude na sua propriedade e sua atividade. Agregue valor ao seu produto com derivados lácteos artesanais, produção de leite A2 ou orgânicos, e esteja sempre atento ao mercado. Quem conseguir, que faça produção em grande escala. Que o produtor compre e venda mais em conjunto, que valorize o cooperativismo e o associativismo. Muito importante também é que apoie participe da Abraleite, que é a legítima representante dos produtores de leite do Brasil de todos os estilos e portes de produção. Que fortaleça cada vez mais essa instituição que luta pelos produtores de leite do país e que vem construindo um cenário melhor através de políticas públicas voltadas à pecuária leiteira, defesa e da classe da organização da nossa cadeia produtiva.
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